Uma ave que quando nasceu pesava apenas 80 gramas e cabia, com folga, na palma da mão (veja aqui). Dez anos depois, já passa dos 90 centímetros e pesa quase cinco quilos. Ela não tem nome, mas simboliza bem o sucesso do Programa de Reprodução de Harpias da Itaipu, considerado o maior do mundo.
Quando nasceu, a harpia era o primeiro caso bem-sucedido de reprodução da espécie em cativeiro no Sul do País. De lá pra cá, outras 31 aves vieram ao mundo. Muitas delas foram doadas para instituições parceiras, conforme explica o biólogo da Divisão de Áreas Protegidas da Itaipu Binacional, Marcos de Oliveira.
“A gente conseguiu ter como resultado um número de filhotes considerável. Isso nos permitiu realizar a troca de filhotes nascidos de um casal reprodutor, com outras aves adultas selvagens, mantidas em outras instituições. Com isso, conseguimos montar um plantel de matrizes, de animais de origem silvestre, que permitiu que conseguíssemos formar casais não parentes.”
De acordo com o biólogo, atualmente quase 30% de todas as harpias mantidas em cativeiro no País estão no plantel de Itaipu. Das 36 instituições espalhadas pelo Brasil, que mantêm harpias em cativeiro, apenas 10 já tiveram resultados de reprodução. Entretanto, nenhuma com a continuidade e expressividade do programa de Itaipu.

Marcos de Oliveira, biólogo da Divisão de Áreas Protegidas da Itaipu. Foto: Kiko Sierich/PTI
Porém, antes do sucesso, foram muitas as tentativas. Os esforços começaram em 2000, com a chegada da primeira harpia ao Refúgio Biológico Bela Vista. O macho foi resgatado de uma caixa de papelão, em Foz do Iguaçu (PR), e a fêmea chegou em 2002, resultado de operações contra o tráfico de animais silvestres, na Bahia. Ela foi levada ao Zoo de Brasília (DF) e, depois, à Itaipu.
Novas técnicas
Em julho de 2004, as harpias foram colocadas em recintos próximos para começar a formar o casal. O filhote não vingava porque os pais não o alimentavam. Foi então que a equipe resolveu mudar o protocolo. Um dos “truques” na alimentação é se esconder atrás de uma cortina. Isso para a ave não associar a figura e a voz humana ao fornecimento de alimento.
“A reprodução não aconteceu naturalmente porque teve que fazer uma intervenção artificial. Os ovos são buscados na chocadeira. Quando nascem os filhotes, passamos a alimentá-los por meio de pinças. Nos primeiros dias, eles comem até cinco vezes por dia. São animais carnívoros, e conforme esses filhotes vão crescendo com a frequência de alimentação diminuindo. Passam a se alimentar por conta, depois ficam num sistema de isolamento para evitar que eles façam um vínculo com o ser humano”.
Desde então, a técnica deu certo e a reprodução de harpias engrenou. De 2009 pra cá, todo ano tem nascimento. Em 2017, aconteceu o primeiro nascimento de uma harpia cuja mãe também é nascida em cativeiro, feito inédito na América do Sul.
Próximo desafio
Embora os esforços em reprodução continuem, o objetivo, agora, é dar um passo adiante para e num futuro próximo devolver as aves nascidas em cativeiro à natureza.
“Hoje conseguimos ter um método eficiente de criação de harpia em cativeiro. Nos próximos passos, pretendemos, juntamente com parceiros, definir áreas de testes de solturas de animais nascidos em cativeiro. Esse seria o sonho da continuidade do trabalho, fechando um ciclo, em que se consegue reproduzir em condições artificiais, depois fazer a reintegração de um animal nascido em cativeiro num ambiente natural, onde já não ocorre mais, na tentativa que esses animais se adaptem a esse novo local e consigam se reproduzir lá”.
Para isso, as aves precisam estar expostas a situações naturais, como procura de comida ou a proteção da chuva e do sol. O Programa já está em contato com outras instituições para encontrar locais onde seriam feitas estas solturas. Outra intenção é a criação de um recinto especial no Refúgio para dar condições de o casal aprender a alimentar o filhote.
O casal pioneiro, aqueles que começaram esta história em janeiro de 2009, seria colocado neste recinto especial. Talvez um prêmio após dez anos contribuindo com a preservação da espécie, considerada ave símbolo do Paraná.